Depois de tanto tempo, de modo tímido e com gestos banhados de curiosidade, entrei no seu quarto outra vez. Já foi nosso mundo, já guardou nossos segredos, foi o palco do amor que supomos ter sentido. É bem pequeno, menor que o meu, com suas coisas masculinas e estranhamente familiares ainda. Não deviam mais ser minhas conhecidas, mas é inevitável enxergar no vidro do seu desodorante, o filme comprimido de todas as vezes que te vi se vestir. Tudo tão bonito, mas a felicidade não era real.
Nossas fotos
ainda estavam sobre a estante. Amareladas pelo tempo e empoeiradas pela sua
falta de cuidado. Mas o que eu podia esperar? Que você polisse os porta-retratos?
Mesmo depois de tanto tempo, não é surpresa nenhuma eles ainda estarem lá. Você
sempre foi mais apegado às provas físicas do amor que fizemos. Eu me afasto da
dor, você à deixa ao alcance dos olhos. Isso é masoquismo, querido.
O quarto estava
quente, parecia reafirmar o calor que costumávamos sentir, depois de entrar. Eu
não me permiti chorar, seria ridículo, você interpretaria errado e eu não
poderia culpá-lo. Nem mesmo eu tinha tido tempo de racionalizar as lágrimas que
estavam prontas pra escapar. Acho que não importa tanto o modo como eu me
sentia sufocada na época, nas fotos, eu ainda sorria. Acho que, mesmo sabendo
que não quero aquele tempo de volta, ainda aperta pensar que acabou.
Ter o fim assim,
tão próximo do tato, me pegou desprevenida. Mesmo sabendo que o amor que pintávamos
não era assim tão colorido e que o sorriso registrado nas fotografias sempre me
deixava com o rosto dolorido, por não ser autêntico, nosso “quase” me deixou
nostálgica. Voltei pra casa pensativa e, tenho certeza que você pensou que
fosse um reflexo da minha tristeza, mas não. Na verdade, aprendi com você que
sorrir, quando não se está com vontade, pode ser doloroso, pode iludir alguém,
pode provocar desastres.
Achei melhor ir
embora, sabe. Pensar nas mentiras bonitas do passado não me fez bem. Quero
sorrir agora. E sorrir de verdade, por um motivo real.
“Entre os pássaros de barro descansando na estante
Pelas costas amarelas dessas fotos insinceras
Descobri lindas mentiras tão terríveis quanto belas
Digo o que fazer então, são memórias tão reais
Do que nunca aconteceu”
Pelas costas amarelas dessas fotos insinceras
Descobri lindas mentiras tão terríveis quanto belas
Digo o que fazer então, são memórias tão reais
Do que nunca aconteceu”
Skank
Nossa, muito triste este post, mas muito bem feito. É até revelador, carregado de palavras tristes e sinceras, que machucam até quem lê, e até mata aos poucos quem escreveu, de tão forte que é da realidade de muitas pessoas.
ResponderExcluirAdorei!
http://livronasmaos.blogspot.com.br
@Markos Queiroz
ResponderExcluirNossa, muito obrigada. É incrível quando alguém é realmente afetetado pelo que eu escrevo. Quando alguém realmente entende. Enfim, muito obg. *-*