Hoje eu estava lembrando de
outros tempos, quando ficávamos dias inteiros na mesma casa sem trocar mais que
duas palavras. Eu reclamava muito disso, magoada porque sentia que não podia
ser ouvida. A senhora nunca teve o menor pudor em admitir que não sabia ouvir e
demorei a aprender a lidar com isso.
Meu quarto era um refúgio e eu
era capaz de ficar trancada nele por horas a fio. Às vezes lhe expulsava de
forma terrivelmente mal criada depois das brigas. E se seguiam mais dias de
silêncio incômodo. Depois de um tempo, comecei a aceitar a sua personalidade e
vi que cada um tem que lidar com seus próprios traumas e eu decidi que, apesar
de a senhora ser responsável por mim, não te responsabilizaria pelos meus.
Agora estamos bem distantes. E
não falo só geograficamente. Nos falamos de dois em dois dias, por telefone, te
conheço através dos outros e a senhora sabe de mim por redes sociais. As
ligações duram poucos minutos e são interrompidas por instantes de silêncio
constrangedor. Em que lugar do caminho ficamos?
A senhora é a minha referência
mais forte. Está presente no cover do cazuza que cantava no barzinho na noite
passada, está presente no diclofenaco que tomei pra desinflamar meu dedinho
machucado, está presente no vestido indiano que comprei semana passada, e no
protetor solar que comecei a usar todos os dias. Acontece que estamos nos
tornando o passado uma da outra.
Estou vivendo um milhão de coisas
novas e não me agrada a ideia de lhe manter distante de tudo isso. É doloroso
dizer, mas é fato que conversamos mais agora que estamos distantes do que
quando morávamos na mesma casa, mas ainda assim, sinto falta de, ao menos,
poder te ver no fim dos dias e reclamarmos uma com a outra sobre o detergente
novo.
Hoje eu não posso mais me dar ao
luxo de semanas de silêncio, de caras amarradas e gritos na cozinha. Não
brigamos mais, mas perdemos o sal. E lhe prefiro apimentada do que sem gosto
algum. Não quero lhe conhecer apenas por
quem a senhora foi, mas por quem é agora e quero que isso seja recíproco. Nem
que não me ouça, mas esteja aqui. Lhe quero por perto. Sinto sua falta.
Alexya Cristal
Eu simplesmente não gosto de saudade. É uma sensação tão difícil e triste de se superar.
ResponderExcluirDavid - Leitor Compulsivo